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Fui convidado recentemente pelo meu Pai - o criador e detentor deste blogue - a interpretar o uso do telemóvel, pelas pessoas em geral, como sendo uma nova religião.
Na altura não compreendi de imediato o que é que isto poderia significar, nem tão pouco a dimensão desta perspectiva. Cheguei inclusive a considerar, primeiramente, que seriam de grande número os que desejariam dispor de uma inversão daquilo que são as escolhas comuns de hoje em dia: todas aquelas que os outros rejeitam ou então simplesmente esquecem ter. Como ter amigos e não estar com eles, poder ajudar alguém e simplesmente não querer fazê-lo e, especialmente, ter à disposição, uma vida social recheada de experiências sensoriais biológicas e optar pelas diferentes alternativas virtuais.
Todas estas possibilidades apenas dizem ao nosso ego que podemos escolher. Passar os dias alimentando um estômago psíquico e uma fome insaciável de seguranças e convicções, sem razão de ser, como se de gula se tratasse. Só as ter. Só as sentir. Mas deveríamos fazer mais? Há 40 mil anos, bastava-nos isso para sermos felizes. No meio de predadores, risco de fome e tantos outros perigos conflituosos com a nossa sobrevivência, que mais poderíamos querer? Quando a medicina interrompeu a selecção natural do ser humano, a nossa espécie pouco mudou, existindo hoje em dia uma satisfação pela colmatação daquelas mesmas necessidades. Estamos socialmente seguros se tivermos o poder de rejeitar: basta-nos saber que há escolha. Estamos satisfeitos pela noção de sermos capazes de criar uma realidade melhor para quem está perto de nós, as outras tribos, os outros grupos, a nossa própria família, mas não necessitamos de o fazer. Nada disto era uma garantia nos nossos primórdios - estávamos todos em risco e só queríamos segurança e hoje ela não se mede pela quantidade de lanças que temos disponíveis ou pelo número de predadores existentes, mas sim pelos "likes" nas nossas fotos, actividades e alcance social virtual. Todos os nossos impulsos básicos biológicos e psicológicos foram transferidos de um mundo austero, perigoso, violento e selvagem para o único em que se tornou mais fácil este tipo de alimentação: o digital.
Efectivamente a sugestão do meu Pai teve toda a lógica, sendo indiscutível que a fé e a prática religiosa foram os primeiros meios virtuais de satisfação egocêntrica e agora existem outros perfeitamente equiparáveis. A propagação da palavra dos profetas conseguiu uma alienação, na sua maioria inabalável, do cérebro dos fiéis seguidores - processo que envolve, obviamente, neurotransmissores e fenómenos neuroquímicos. Mas quando as religiões estavam a dar os seus primeiros passos, a palavra neurociência estava longe de ser inventada. Hoje a religião do telemóvel tem uma tremenda vantagem, pois consegue saber com exactidão que tipo de "Boa Nova" (novas aplicações) estimularão uma maior produção de dopamina no cérebro, o neurotransmissor responsável pela dependência, vício e prazer. Existem em construção projectos que constituem um autêntico "hackeamento" do cérebro, pelo design de um vício propositado, desenvolvido por neurocientistas. E outros que pretendem a criação de uma rede global de consciência onde possamos vir a estar todos em sintonia e partilha constante de pensamentos - imagino se a palavra privacidade existirá daqui a 20 anos. Felizmente alguns influentes também se encontram a investir em mecanismos digitais que se relacionam com o cérebro, em projectos sem fins lucrativos, com o único objectivo de evitar este "hacking" e proteger a dignidade humana, dotando-a na mesma de um acesso tecnológico que acompanhe os sinais do tempo.
Darei a conhecer todas estas iniciativas num próximo texto e recomendo reflexão sobre que tipo de relação, estabelecem na realidade, os leitores deste blog com o seu telemóvel.
Contacto: neuroinvestigacao@gmail.com
Darei a conhecer todas estas iniciativas num próximo texto e recomendo reflexão sobre que tipo de relação, estabelecem na realidade, os leitores deste blog com o seu telemóvel.
Contacto: neuroinvestigacao@gmail.com
Penso que a tecnologia deveria ser a nova "religião", no sentido em que nos deveríamos apoiar o máximo possível, não tanto a nível de vício ou idolatração de pessoal, mas como um meio para a maior sustentabilidade das espécies e ecosistemas. Em termos quantitativos, o telemóvel (ou tv) foi responsável por menos mortes e chacinas do que qualquer uma religião ou seita... Por isso diga-se o que se disser, como disse o Papa recentemente "Meglio vivere da atei che da cristiani che odiano".
ResponderEliminarO telemóvel por outro lado também permite a partilha de ódios, ameaças, esquemas enganadores, mal entendidos e outros grandes problemas.
Como eu ainda sou do tempo que o telemóvel só servia para fazer telefonemas e escrever sms's, vejo agora o avanço dos smartphones como uma poderosa ferramenta para o desenvolvimento e aproximação das comunidades.
É um tópico para uma boa e longa reflexão, pois realmente podemo-nos questionar como é que a tecnologia e as relações humanas estarão daqui a 10 ou 20 anos.
Olá Rega! Antes de mais obrigado pelo tempo dispendido a ler e comentar. Permite-me comentar de volta (smile)
EliminarNo que toca à comparação entre as pessoas vítimas da religião e do telemóvel e à utilização da tecnologia para a sustentabilidade, em primeiro lugar folgo sempre em ver pessoas preocupadas com esta matéria e defensoras do encontrar de soluções tecnológicas neste sentido. Mas sobre ambas as questões apenas tenho uma convicção e depois uma preocupação que engloba várias outras:
1 - Basta olharmos à criação dos dois bebés geneticamente manipulados e imunes ao virus do HIV, levada a cabo por cientistas chineses, para toda a surpresa do ocidente ainda ocupado em discutir a ética desses novos possíveis procedimentos, para podermos afirmar que estas questões ligadas à neurotecnologia, genética e inteligência artificial vão ser uma realidade, independentemente do debate que se venha a ter.
2 - A falta de intervenção democrática e governamental em vários destes progressos.
Só pretendo chamar à atenção para os riscos dos quais me vou apercebendo e que vou expor nos próximos artigos.
Grande abraço!
São os novos tempos. E há quem diga que é só o começo de um novo mundo, outros que é o inicio do fim. Pessoalmente não sei, passamos de 7 bilhões...! Em 20 anos quantos seremos?
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