Infanta de Portugal e Raínha de Inglaterra (1638 - 1705)
Por Maria Luísa V.Paiva Boléo
Por Maria Luísa V.Paiva Boléo
A infanta portuguesa ficou hospedada em King’s House,
residência do governador da cidade. Porém, uma infecção na garganta vai retê-la
no leito. Nessa altura alguém da corte, talvez o médico, sugeriu dar-lhe a
beber um copo de cerveja, bebida já vulgar em Inglaterra. D. Catarina de
Bragança, com a garganta a arder e com muita febre pediu em espanhol, uma
chávena de chá, o que deve ter provocado uma enorme perturbação entre os presentes,
pois o chá não era bebida conhecida na corte. O chá, hoje a bebida oficial do
Reino Unido, foi, como sabemos, introduzida por esta nossa rainha na corte
inglesa, já vamos saber como e quando. D. Catarina também levou móveis, entre eles preciosos contadores
indo-portugueses que nunca tinham sido vistos em Inglaterra.
D.
Catarina, infanta de Portugal, o tal país que os detractores diziam ser
paupérrimo e com uma corte sem maneiras, introduziu inovações na corte inglesa,
e não apenas o hábito de se tomar chá. Uma das primeiras inovações tem a ver
com a estranheza que a rainha demonstrou ao ser servida, às refeições em pratos
de ouro ou prata. Os alimentos estavam sempre frios e a rainha terá perguntado
porque se não usavam pratos de porcelana, algo que na corte portuguesa já se
usava há muitos anos. Não sabemos se demorou muito tempo a efectuar-se essa
importante mudança na baixela, mas acreditamos, que Carlos II terá mandado
substituí-los. A primeira fábrica de porcelana inglesa só foi fundada, em 1743,
em Chelsea, e a de Worcester em 1751.
A
infanta portuguesa também se deslocou para Inglaterra com uma orquestra
composta de músicos portugueses, o que era um sintoma de civilidade e cultura.
Se não formos nós portugueses a fazer referência a estes pormenores, eles ficam
esquecidos na História Universal, normalmente feita por homens e que pouco
valor dão aos pormenores que marcam a diferença.
Um dos primeiros navios saídos dos estaleiros ingleses, logo
após o casamento, teve o nome da rainha, por escolha do rei. Mais tarde,
durante as lutas entre a Holanda e a Inglaterra, Catarina fez questão de
oferecer à esquadra de Carlos II, uma fragata, paga por si, com o significativo
nome de Saudades. Como vemos isto é uma atitude de uma rainha perfeitamente
respeitada e integrada na sociedade inglesa.
D.
Catarina de Bragança tentou impor na corte as saias mais curtas, onde se
pudessem ver os seus pés delicados, mas as damas da velha Albion, de pés
grandes, não a seguiram. Outra inovação introduzida por Catarina foi a
substituição da máscara de passeio em seda negra pelos leques, numa perfeita
herança espanhola de sua mãe, D. Luísa de Gusmão.
O duque
de Iorque, segundo irmão de Carlos II casou, em primeiras núpcias com Ana,
filha de Lorde Chanceler. Tendo enviuvado casou com a muito jovem e católica
princesa italiana, Maria Beatriz de Modena e passou também ele a professar a
religião católica. A corte mostrou-se extremamente fria com a nova princesa, e
foi a rainha Catarina quem a recebeu com muito afecto e mandou vir uma
companhia de ópera expressamente de Itália, para comemorar o facto e para lhe
agradar. Foi esta a primeira vez que uma ópera italiana foi ouvida em Inglaterra.
É curioso notar, que ainda hoje, nas camadas populares de certas regiões da
Grã Bretanha se diz «tchá», como em Liverpool.
A
rainha Catarina terá ensinado a preparar o chá e a bebê-lo acompanhado de
bolos. E passou a ser preparado em bules de porcelana. Pensa-se que a princesa
portuguesa, ou alguma dama da sua comitiva, terá levado para a corte inglesa a
receita do doce de laranja, preparado na zona de Vila Viçosa, onde este fruto
abunda. A verdade é que o termo «marmalade» é a palavra portuguesa «marmelada»,
que é confeccionada com marmelo, fruto que não era conhecido em Inglaterra. A
«marmalade» inglesa é doce de laranja. A «marmelada» portuguesa entrou em
Inglaterra em 1495
No Novo Mundo, a
cidade de Nova Amsterdão, fundada por holandeses, em 1626, foi conquistada pelo
duque de Iorque, irmão de Carlos II e passou, em 1664, a denominar-se Nova
Iorque. As áreas próximas da cidade passaram a King’s Country e Queens Country.
(Nova Iorque só passou definitivamente para a posse de Inglaterra, em 1674).
Em 1998
esteve programada a inauguração, em Queens de uma estátua monumental à rainha
Catarina. A iniciativa da construção da uma estátua partiu da associação
Friends of Queen Catherina e contou com o apoio de várias entidades
portuguesas, públicas e privadas. Previa-se uma festa com pompa e
circunstância, o que não aconteceu, porque houve movimentos cívicos
norte-americanos que se opuseram, alegando que a rainha D. Catarina de Bragança
fora «a responsável» pela introdução de mão-de-obra negra, ida de África, nas
então colónias inglesas. Enfim, nada como pôr as culpas aos mais fracos. Que
puder tinha D. Catarina para tal? Essa decisão coube ao rei e aos seus
conselheiros.
Normalmente
o cidadão comum não sabe exactamente o que é um anacronismo, isto é não sabe que
se não pode ver uma época com a mentalidade que se tem no presente. A
escravatura era algo, que era aceite na época, passe tudo o que isso hoje nos
possa repugnar. Daí que D. Catarina ficou com a estátua arrumada num armazém. E
não se fala de nada porque não é politicamente correcto.
Todavia, sua popularidade nos Estados Unidos da América era bastante
elevada. Acarinhada pela população local, em sua homenagem foi dado o nome de Queens a um dos
cinco bairros da cidade de Nova York.
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